Entre botões e pensamentos, instalo-me silencioso.
Observo-te nos gestos simples de teu cotidiano.
Olhas teu rosto no espelho embaçado,
Penteias os cabelos negros com sutileza,
E diriges teu carro em precisão.
Quando cruzas meu caminho e não me vês,
O vento que agitas com tua pressa, invade-me o nariz e o
peito.
Deixas o rastro de teus desejos ao passar.
Lobo, uivas em luas cheias e crescentes,
Em busca de saciar tua fome implacável.
Bebes e conversas sobre teus assuntos corriqueiros,
Trabalhas e te divertes em companhia de amigos.
Não sabes que enquanto caminhas olhando as nuvens e as
estrelas,
Logo à frente abrir-se-á fenda de mistério,
Onde acre e doce abismo te espreita,
Esperando o inevitável da queda.
Para então receber-te.
E aconchegar-te em corpo e espírito.
Prisioneiro de tuas próprias vontades,
Morres todas as noites,
Em gozos lentos e demorados.
Renascendo em manhãs que guardam, em silêncio,
A embriaguez das horas infindáveis de ardor carnal.